Você conhece o hidrogênio musgo?

AUTORIA : 

Gustavo Mockaitis

Gustavo Mockaitis

Todos sabemos que o hidrogênio é um combustível promissor para a transição energética, pois é renovável, abundante e não emite gases de efeito estufa. No entanto, sua produção, armazenamento e transporte ainda são grandes desafios científicos e tecnológicos.

Na miríade de cores do hidrogênio, muito se fala sobre o hidrogênio verde, que é o hidrogênio obtido por meio de eletrólise. Mas existe uma alternativa mais sustentável à produção de hidrogênio verde, que é a fermentação escura. A fermentação escura (do inglês "dark fermentation") é um processo biológico que utiliza microrganismos para converter matéria orgânica em hidrogênio e dióxido de carbono. Esse processo pode ser realizado com diferentes tipos de biomassa, como resíduos agrícolas, florestais e urbanos. O processo ocorre em condições anaeróbias (sem oxigênio), com alguns dos mesmos microrganismos envolvidos na produção de biogás. A Empresa de Pesquisa Energética (EPE), em seu documento "Bases para a Consolidação da Estratégia Brasileira do Hidrogênio" de 2021, classifica este hidrogênio como "hidrogênio musgo", talvez em uma referência ao verde intenso dessa cor.

Os microrganismos envolvidos no processo são denominados hidrogenogênicos, que são capazes de produzir hidrogênio a partir da fermentação de açúcares e outros compostos orgânicos.

O processo de produção de hidrogênio musgo pode ser dividido em três etapas principais:

  1. Preparo da biomassa: A biomassa é pré-tratada para remover impurezas e tornar os açúcares e outros compostos orgânicos mais acessíveis aos hidrogenogênicos;
  2. Fermentação: A biomassa pré-tratada é fermentada pelos hidrogenogênicos em um ambiente anaeróbico. Durante a fermentação, os hidrogenogênicos produzem hidrogênio, dióxido de carbono e outros produtos, principalmente ácidos orgânicos voláteis, como acético, propiônico, butírico e lático;
  3. Separação do hidrogênio: O hidrogênio produzido na fermentação é separado do dióxido de carbono e outros produtos gasosos. A separação pode ser realizada por diferentes métodos, como osmose reversa, destilação ou absorção.
Biorreatores anaeróbios são os equipamentos para a produção do hidrogênio musgo

O hidrogênio musgo apresenta uma série de vantagens em relação a outros métodos de produção de hidrogênio. Trata-se de uma alternativa renovável, pois a biomassa utilizada como substrato para a fermentação pode ser renovável, como resíduos agrícolas, florestais e urbanos. Além disso, a matéria prima para este processo é abundante e de baixo custo pois é amplamente disponível.

No entanto, o hidrogênio musgo ainda enfrenta alguns desafios, pois o processo ainda precisa ser melhor investigado para se atingir uma produção mais estável e eficiente. A eficiência do processo de fermentação escura ainda é baixa, o que significa que uma grande quantidade de biomassa é necessária para produzir uma pequena quantidade de hidrogênio. A estabilidade também é um problema, uma vez que o hidrogênio é uma fonte de energia para os microrganismos, que logo desenvolvem estratégias para consumi-lo no próprio processo.

Já o hidrogênio verde é produzido por eletrólise da água, em um processo que utiliza energia elétrica para separar o hidrogênio do oxigênio. O hidrogênio verde é considerado uma fonte de hidrogênio limpa e sustentável, mas seu processo de produção é caro e requer grandes quantidades de energia elétrica. Vale ressaltar que o hidrogênio verde só será sustentável se, e somente se, a fonte de energia elétrica para a eletrólise for sustentável.

Uma analogia entre essas duas fontes de hidrogênio pode ser feita com os carros elétricos. Carros elétricos tradicionais carecem de sustentabilidade, apesar de todo o apelo midiático, pois dependem de energia elétrica nem sempre obtida de forma sustentável, isso sem contar com o desastre ambiental devido a construção das baterias, que requerem quantidades enormes de minérios.

Eletrolisadores industriais para a produção de hidrogênio verde têm alta demanda energética.

Já carros elétricos movidos à biocombustíveis (cuja energia é gerada por meio de células combustível), não necessitam dessas mesmas baterias, e podem obter sua energia de maneira totalmente renovável. O hidrogênio verde é como o carro elétrico tradicional, enquanto o hidrogênio musgo é como o carro elétrico à biocombustível.

O hidrogênio musgo é uma alternativa promissora à produção de hidrogênio verde. O processo apresenta uma série de vantagens, como a sustentabilidade, a abundância e o baixo custo. No entanto, o hidrogênio musgo ainda enfrenta alguns desafios, como a baixa eficiência e o alto custo de produção.

Pesquisas estão sendo realizadas para melhorar a eficiência do processo de fermentação escura e reduzir seu custo. Com o desenvolvimento dessas tecnologias, o hidrogênio musgo pode se tornar uma fonte de hidrogênio limpa, acessível e sustentável.